30/09/2022 às 08h28min - Atualizada em 30/09/2022 às 08h28min
Caso Samarco: decisão judicial atende instituições de Justiça e obriga Fundação Renova a implementar direitos de pessoas atingidas
Na decisão, o Juízo da 12ª Vara Federal de Belo Horizonte (MG) acolheu os pedidos das instituições de Justiça para impedir cortes arbitrários do Auxílio Financeiro Emergencial (AFE) efetuados pela Fundação Renova
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MPF Entre as conquistas, está o restabelecimento do Auxílio Financeiro Emergencial a todas as pessoas que tinham aderido ao sistema indenizatório online criado pela entidade, assim como a devolução do que foi indevidamente retido.
As instituições de Justiça que atuam no caso Samarco [Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Ministério Público do Espírito Santo (MPES), Defensoria Pública da União (DPU), Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais (DP/MG) e Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo (DP/ES)] obtiveram uma importante decisão judicial a favor dos direitos de pessoas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão, de propriedade da Samarco, Vale e BHP Billinton, ocorrido há cerca de sete anos, em Mariana (MG).
Na decisão, o Juízo da 12ª Vara Federal de Belo Horizonte (MG) acolheu os pedidos das instituições de Justiça para impedir cortes arbitrários do Auxílio Financeiro Emergencial (AFE) efetuados pela Fundação Renova, entidade que representa as mineradoras na implementação de programas e atendimento aos municípios, comunidades e pessoas atingidas.
Recentemente, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu que o AFE não possui natureza de lucro cessante, mas sim de pagamento com caráter assistencial, temporário e indisponível, não sendo aceitável a interrupção, negociação e/ou antecipação de pagamentos futuros até o restabelecimento de condições para a retomada, pelos impactados, das atividades produtivas ou econômicas, e isso a depender do resultado de perícia que ainda não foi concluída.
“Ou seja, o AFE deve ser pago a todo o universo de atingidos que tenham tido sua renda comprometida. Além disso, como ele possui caráter assistencial, não pode ser descontado no âmbito do Programa de Indenização Mediada (PRM), muito menos cortado quando a pessoa atingida adere ao Novel [sistema indenizatório on-line criado pela Renova]”, explica o procurador da República Carlos Bruno Ferreira da Silva.
Ele ainda diz que, “especificamente quanto ao Novel, ainda que o sistema confira quitação definitiva e integral, isso não significa que todas as obrigações estão cumpridas. Esse entendimento da Renova foi considerado equivocado pela instância superior, raciocínio com o qual concorda o novo titular da 12ª Vara Federal”.
Além disso, como consequência desse entendimento, o Juízo Federal obrigou a Fundação Renova a restabelecer o direito a tal recebimento, no prazo máximo de 15 dias, para todas as pessoas atingidas que aderiram ao Novel e tiveram o seu AFE cortado por tal motivo, sob pena de multa diária no valor de cinco mil reais para cada atingido. Esse pagamento deverá ser feito de forma retroativa, corrigido monetariamente pelo IPCA-E e com juros de mora de 1% ao mês a contar da data em que cada parcela deveria ter sido originariamente paga.
Indenizações pelo Novel – A decisão judicial também esclareceu outros aspectos a respeito das indenizações pagas por meio do Novel.
A partir de agora, atingidos que venham a aderir ao Novel pleiteando indenização por danos gerais também poderão solicitar os valores fixados para o “Dano Água”, e vice-versa.
“Isto significa que as pessoas já indenizadas, por exemplo, em razão da interrupção de suas atividades econômicas e produtivas, como é o caso dos pescadores, ainda podem aderir ao Novel para receber indenização decorrente da interrupção do serviço de abastecimento de água potável encanada, que está prevista sob o título Dano Água, bastando apresentar os documentos de elegibilidade exigidos para a demonstração da titularidade desse direito”, afirma Carlos Bruno Ferreira. “Do mesmo modo, aqueles que já foram indenizados pelo Dano Água também podem buscar indenizações, via Novel, relativamente à interrupção das suas atividades produtivas e econômicas, o que, até então, era negado pela Fundação Renova. Há uma ressalva, porém. Os atingidos que já tenham sido indenizados pelo Dano Água no âmbito do PIM não poderão ser indenizado via Novel pelo mesmo dano, embora possam utilizar este sistema para ser indenizado com relação aos danos gerais”.
Devolução de cobrança indevida - O Juízo Federal também obrigou a Fundação Renova a pagar todas as indenizações, no âmbito do Novel, acrescidas de correção monetária e juros moratórios a partir da fixação das matrizes de danos ou das sentenças condenatórias, e proibiu o desconto de honorários advocatícios do montante indenizatório devido às pessoas atingidas que aderiram ao sistema. De acordo com o magistrado, cabe à própria Renova arcar com as despesas de honorários advocatícios (10%), não podendo transferir tal ônus para as pessoas atingidas.
“Além disso, uma conquista importante obtida pelas instituições de Justiça em favor das pessoas atingidas foi a que obriga a Fundação Renova a restituir os valores de honorários advocatícios indevidamente descontados das indenizações pagas aos atingidos que aderiram ao Novel, com correção monetária a contar da data da publicação da sentença de matriz de danos utilizada como parâmetro para a indenização e aplicando juros de mora a partir do dia em que o desconto indevido foi realizado. Esse pagamento deverá ser realizado pela Renova dentro do prazo máximo de 120 dias, contados da data da publicação da decisão”, informa Carlos Bruno Ferreira.
O procurador da República ainda esclarece que, por se tratar de uma ordem judicial, não é necessário que a pessoa atingida solicite a devolução ou que contrate advogado para fazê-lo em seu nome, eis que a decisão determinou que a Renova faça a devolução diretamente aos beneficiados.
Revisão do PAFE – Outra questão abordada pela decisão judicial diz respeito ao procedimento de revisão de cadastro efetuado pela Renova no Programa de Auxílio Financeiro Emergencial (PAFE).
Segundo o magistrado, apesar de haver autorização judicial para a realização do corte de eventuais pagamentos indevidos, o procedimento de revisão deve, obrigatoriamente, seguir critérios razoáveis e adequados, em respeito ao princípio da transparência e garantindo-se a participação dos atingidos e das instituições de justiça.
Para o Juízo Federal, a mera notificação e chamamento para revisão do AFE em massa, utilizando-se critérios unilaterais, sem discussão prévia de sua pertinência e adequação com os diversos atores processuais, não atende ao devido processo legal e simplesmente reforça que não é possível admitir qualquer corte de AFE sem a concordância do Juízo e avaliação prévia do CIF.
Foi determinado à Renova que restabeleça, em até 10 dias corridos, o direito ao AFE para atingidos que tiveram seus pagamentos interrompidos em razão do procedimento de revisão unilateral de cadastro efetuado pela fundação, devendo-lhes efetuar o pagamento retroativo das parcelas indevidamente retidas, corrigidas monetariamente pelo IPCA-E e com juros de mora de 1% ao mês a contar da data em que cada parcela deveria ter sido originariamente paga.
A Fundação Renova ainda foi proibida de promover o corte de qualquer AFE sem a anuência do Juízo e do CIF, sob pena de fixação de multa diária de R$ 50 mil por auxílio cortado sem autorização judicial. Ela também deverá apresentar ao CIF uma proposta de procedimento de revisão, que somente produzirá efeitos após homologação judicial.